Saturday, February 23, 2008

A VELHINHA, O TELEFONE E A PINHA

A velhinha caminhava cambaleante pela rua 7 de abril, em São Paulo. Não tomara nenhuma bebida alcoólica, mas parecia que estava bêbada. Olhava os prédios, as janelas dos prédios, as lojas e a multidão que caminhava. Por isso, estava tonta. Não era acostumada a nada disso.

Moradora da zona rural, numa pequena propriedade entre Jundiaí e São Paulo, chegara de trem até à Estação da Luz, com o objetivo de chegar à companhia telefônica da rua 7 de abril.

Como viera do bairro da Luz até aquela rua barulhenta e como vencera as mil peripécias para esse feito, nem ela mesmo seria capaz de explicar. Mas estava ali, e precisava encontrar a companhia telefônica.

Uma alma caridosa ajudou-a, finalmente a chegar ao seu destino. Entrou, radiante, no saguão da tão almejada empresa.

Aproximou-se da mesa de uma recepcionista, que, prontamente sentou-a numa cadeira e, com um sorriso nos lábios, fez-lhe a clássica pergunta:

- Em que posso ajudá-la, minha senhora?

A velhinha, um dos últimos exemplares do remanescente caipira das circunvizinhanças da capital paulista, respondeu-lhe em seu clássico linguajar:

- A mocinha num se preocupa cumigo, que eu não bebi não. Só tô com um pouco de bambura nas perna de vê tanto prédio arto e fartura de gente. Mais vim aqui amode comprá um apareio de telefone lá pro meu sítio.

E explicou, à sua maneira, que o marido, velho como ela. já não tinha a agilidade de antes, para ir e voltar do sítio à cidade, pois o reumatismo não deixava. Por isso, fazia-se necessário um aparelho telefônico.

- Entendi, atalhou a recepcionista - a senhora precisa de uma linha telefônica rural. Então, para que a companhia verifique se é possível instalar um telefone em seu sítio, a senhora deve levar estes papéis, preenchê-los direitinho e trazê-los novamente até aqui, juntamente com um croquis de seu sítio...

- Crô o quê, minha fia? Óia que nesses quase oitenta anos de vida, nunca ouvi falá nesse negócio...

- Calma, minha senhora, explicou, com muita educação, a recepcionista - não se preocupe com o nome. Croquis é apenas um mapinha que a senhora deverá trazer, de sua propriedade.

-Ah, bão! - respondeu com alegria a velhinha. Pois se é só isso, já vou me indo, mode providenciá tudo.

E agradecendo a gentileza da recepcionista, despediu-se, não antes de enfiar nas mão da atendente uma moeda de um real.

- Não rejeite a grojeta dessa véia, que a moça foi muito das bondosa. E, sem dar tempo para a resposta, já sem tanta "bambura", bateu em retirada.

Um mês inteiro se passou. Numa segunda-feira de manhã, eis que a velhinha entra sorridente e vem dar à mesa da mesma recepecionista, que recebeu-a, efusivamente.

- Tá tudo aqui o que me pediu, minha fia. E foi retirando os papéis da bolsa. Por último, retirou, bem lá do fundo, um objeto um tanto grande e cheio de pontas, que fez cair, pesadamente, sobre a mesa.

Diante do olhar incrédulo da recepcionista, de suas colegas de trabalho e de todos os clientes ali presentes; acuada como quem estivesse sido apanhada roubando doce de criança, a velhinha explicou:

- Ué, a moça num disse que era pra mim trazê uma pinha???!!!

Antônio Tadeu Ayres